domingo, 14 de dezembro de 2008

DISPOSTAS EM CRUZ

A imagem do crucifixo deitado sobre o peito aberto ainda lhe ardia as retinas. Um convite mudo e franco.
Não era tanto pela beleza dos detalhes implícitos. Encantou-a por revelar a personalidade daquele homem que lhe oferecia uma paz buliçosa, despertando nela uma vontade mista de reverência e desacato.
Diante daquela imagem, suas idéias desenhavam-se e desagregavam-se num rodamoinho que a afastava da redenção desejada e a aproximava de um silêncio profano.
Hoje, lembrando daquele momento, daquela imagem, estendia as mãos como quem busca tocar um altar construído em nuvens desfeitas a cada vaga lembrança.
As mãos estendidas reclamavam mais do que um firme aperto de mãos, queriam tocar a alma, rogavam ao inexorável, queriam compreender a resposta de uma pergunta não feita.
As mãos reuniam-se, agora, atravessavam uma na outra em súplica discreta, dispunham-se em cruz, sentindo as batidas perfeitas de um coração sob um peito aberto, e sobre o qual elas se permitiam deitar.

Nenhum comentário: